Sanju Bhagat e o Mistério de Trinta e Seis Anos


 

Por trinta e seis anos, Sanju Bhagat carregou dentro de si um segredo que nem ele próprio suspeitava: seu irmão gêmeo, malformado e parasita, vivendo como um feto aprisionado em seu abdômen.

Nascido em 1963 na cidade de Nagpur, no centro da Índia, Sanju cresceu como um homem simples, trabalhando duro como agricultor para sustentar a família em meio às dificuldades cotidianas da vida rural.

Desde a infância, ele notava algo de estranho em seu corpo: uma barriga protuberante que o fazia se destacar entre os vizinhos. No início, era apenas um inchaço discreto, que ele atribuía a uma má digestão ou à dieta pobre.

Mas, à medida que os anos passavam, o volume aumentava de forma alarmante. Pela casa dos 20 anos, sua silhueta já lembrava a de uma mulher grávida, o que lhe rendeu o apelido cruel de "homem grávido".

As zombarias eram constantes - crianças riam nas ruas, adultos cochichavam, e Sanju, envergonhado, evitava espelhos e conversas sobre o assunto. Ele se contentava em trabalhar nos campos, colhendo algodão e arroz, ignorando o desconforto que crescia junto com o inchaço.

Com o tempo, porém, os sintomas se agravaram. O "tumor", como ele e os poucos médicos locais imaginavam, pressionava seu diafragma, tornando a respiração um suplício diário. Sanju mal conseguia se abaixar para plantar ou carregar sacos pesados sem ofegar como se estivesse subindo uma montanha.

Em junho de 1999, aos 36 anos, o pior aconteceu: exausto após um dia de labuta sob o sol escaldante, ele desabou no chão da cabana, lutando para puxar o ar. Sua família, em pânico, o levou às pressas para o Tata Memorial Hospital, em Mumbai, um centro de referência em oncologia na Índia.

O cirurgião-chefe, Dr. Ajay Mehta, examinou o paciente com urgência. O abdômen de Sanju era uma massa distendida, quase a ponto de estourar, medindo mais de 50 centímetros de circunferência. "Parecia um tumor gigantesco", recordou Mehta anos depois em entrevistas.

Suspeitando de um câncer abdominal raro, a equipe preparou a cirurgia de emergência. Sob anestesia, eles abriram a incisão - e o que veio a seguir chocou a todos.

Em vez de um tumor sólido, galões de fluido amniótico-like jorraram para fora, como se uma bolsa d'água tivesse rompido. Ao aprofundar o corte, os médicos sentiram algo se mexer: mãos e pés humanos, ossos frágeis, cabelos longos e unhas afiadas. Não era um tumor. Era um corpo - ou o que restava de um.

O que eles extraíram era o feto de um gêmeo parasita, pesando cerca de 2 quilos, com forma humana parcial, mas sem crânio completo nem órgãos vitais funcionais. "Ficamos horrorizados, confusos e maravilhados ao mesmo tempo", admitiu o Dr. Mehta. "Parecia que Sanju havia dado à luz.

"O diagnóstico veio logo depois: fetus in fetu, uma condição raríssima (ocorre em cerca de 1 em cada 500 mil nascimentos), em que um gêmeo idêntico é absorvido pelo outro durante a gestação, tornando-se uma massa teratoma parasita que se alimenta dos fluidos e nutrientes do hospedeiro.

No caso de Sanju, o irmão gêmeo havia "crescido" ao longo das décadas, nutrindo-se do conteúdo de seu estômago, como um parasita interno.

Especialistas acreditam que isso ocorreu porque os gêmeos compartilhavam a placenta, e o feto dominante (Sanju) "engoliu" o mais fraco ainda no útero, sem que ninguém percebesse ao nascimento - afinal, exames de rotina não existiam na Índia rural dos anos 1960.

A cirurgia, embora arriscada devido ao tamanho da massa e à proximidade com órgãos vitais, foi um sucesso. Sanju acordou aliviado, com a barriga agora vazia e a respiração livre pela primeira vez em décadas. Mas o trauma psicológico foi profundo.

Ele se recusou a olhar para o "monte de carne e cabelo" que os médicos preservaram para estudos, preferindo fingir que nada daquilo havia existido. "Eu não quero saber", disse ele em uma rara entrevista anos depois.

A família, chocada, manteve o segredo por um tempo, mas a notícia vazou para a imprensa indiana e internacional, transformando Sanju em uma sensação midiática. Jornais como o The Times of India o chamaram de "o homem que carregou um irmão por 36 anos", e documentários médicos o citaram como um dos casos mais extremos de gêmeos siameses internos.

Anos após a operação, Sanju voltou à rotina como agricultor em Nagpur, agora com uma vida mais leve - fisicamente, pelo menos. As zombarias diminuíram, mas não sumiram: vizinhos ainda brincam que ele "teve o bebê" na cirurgia.

Aos 62 anos em 2025, ele leva uma existência modesta, longe dos holofotes, casado e com filhos que cresceram sabendo da história como uma lenda familiar.

Seu caso inspirou avanços na detecção pré-natal de anomalias gemelares na Índia, com mais ultrassons em clínicas rurais, e continua a fascinar a comunidade médica global, servindo de alerta sobre como o corpo humano pode abrigar mistérios inimagináveis por gerações inteiras.

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