A História Macabra da Família Albuquerque
Canibais do Sertão Baiano que se Alimentaram
de Escravos Fugitivos por 23 Anos (1839-1862) Uma das histórias mais sombrias e
menos conhecidas da escravidão no Brasil aconteceu no sertão da Bahia, na
região do rio São Francisco, entre as décadas de 1840 e 1860.
A família Albuquerque - formada pelo
fazendeiro João José de Albuquerque, sua esposa Maria Joaquina e pelo menos
quatro filhos adultos - tornou-se lendária (e temida) por praticar canibalismo
sistemático contra escravizados fugidos e viajantes que cruzavam suas terras.
Como tudo começou
Por volta de 1839, João José de Albuquerque,
dono da Fazenda Boa Vista (próximo ao atual município de Barra, na margem
esquerda do São Francisco), começou a sofrer com fugas constantes de seus
cativos. Em vez de simplesmente recapturá-los ou entregá-los às autoridades,
ele e a família decidiram aproveitar a carne humana como alimento.
Segundo relatos da época registrados em
processos judiciais e inquéritos policiais preservados no Arquivo Público do
Estado da Bahia, a família matava, esquartejava e salgava os corpos dos
fugitivos, conservando a carne em barris ou defumando-a no teto da casa-grande,
junto com a carne de porco e de boi.
Testemunhas (vaqueiros, agregados e até
parentes distantes) afirmaram que a carne humana era servida rotineiramente na
mesa da família, muitas vezes misturada a feijão, farinha e legumes, sem que
visitantes soubessem do que se tratava. Crianças da família cresciam vendo
aquilo como algo normal.
O terror que se espalhou
Durante 23 anos, estima-se que pelo menos 80
a 100 pessoas tenham sido assassinadas e devoradas. A maioria era composta por:
escravizados fugidos de fazendas vizinhas; tropeiros e canoeiros que
pernoitavam na propriedade; indígenas e pessoas livres pobres que passavam pela
estrada real.
A família tinha um método cruel: ofereciam
comida e pouso aos viajantes, drogavam-nos com chá ou cachaça misturada com
ervas soníferas e, durante a noite, degolavam as vítimas.
Os corpos eram imediatamente desossados e
processados. Ossos eram jogados no rio ou enterrados em locais afastados. Por
causa disso, a Fazenda Boa Vista ficou conhecida como “a casa onde ninguém sai
vivo”.
O fim do pesadelo
Em 1862, um vaqueiro chamado Antônio Dó, que
havia trabalhado anos na fazenda, fugiu e denunciou tudo ao juiz de paz de
Barra. Uma força policial comandada pelo subdelegado José Joaquim de Sousa
Breves invadiu a propriedade em setembro daquele ano. Os policiais encontraram:
barris com carne humana salgada; pedaços defumados pendurados no telhado; panelas
ainda com restos de cozido humano.
João José, Maria Joaquina e três filhos
(José, Manoel e Antônio) foram presos imediatamente. Um quarto filho conseguiu
fugir e nunca mais foi encontrado. O julgamento, realizado em Salvador, causou
comoção nacional.
Apesar das provas irrefutáveis e das
confissões parciais dos réus (que alegavam “fome” e “costume antigo”), apenas
João José e a esposa foram condenados à morte (pena depois comutada para prisão
perpétua).
Os filhos pegaram penas menores.
João José morreu na cadeia em 1868. Maria
Joaquina enlouqueceu e faleceu em 1871. A Fazenda Boa Vista foi abandonada e,
com o tempo, virou ruína. Até hoje, moradores antigos da região contam que, em
noites de lua cheia, ouvem-se gemidos vindos das margens do São Francisco -
dizem que são as almas dos escravizados que nunca tiveram sepultura.
Curiosidades e desdobramentos
A história inspirou lendas regionais como a
da “Mãe dos Escravos” (um espírito que protege fugitivos) e influenciou contos
de horror sertanejo. Em 1890, o jornal O Alabama, de Salvador, publicou uma
série de reportagens sobre o caso, chamando a família de “os ogros do São
Francisco”.
Há quem diga que descendentes distantes dos
Albuquerque ainda vivem na região, mas sob outro sobrenome, carregando o
estigma.
É uma das poucas histórias documentadas de canibalismo prolongado e organizado no Brasil escravista - um capítulo que muitos preferem esquecer, mas que mostra até onde chegava a desumanização daquele sistema.

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