Viktor E. Frankl - O Propósito que Vence o Abismo


 

“Tiraram-me o nome, a liberdade, a família..., mas nunca conseguiram apagar minha consciência. Sobrevivi a quatro campos de concentração - Theresienstadt, Auschwitz, Kaufering e Türkheim.

Marcaram-me com um número, arrancaram-me tudo: meus livros, meus sonhos, minha esposa grávida, Tilly, e até a esperança de um futuro com o filho que ela carregava.

Todos os dias, testemunhava a morte. Alguns, em desespero, atiravam-se contra as cercas elétricas, buscando um fim rápido. Outros simplesmente desistiam, deixando a vida escoar em silêncio.

Eu também cheguei ao limite, à beira do abismo. Mas decidi que, se não podia mudar meu destino, podia transformar minha atitude diante dele. Uma noite, tremendo de frio em um barracão imundo, com o estômago vazio e o corpo exausto, imaginei-me em uma sala de aula, em uma universidade distante, dando uma palestra sobre tudo o que havia vivido.

Visualizei-me compartilhando não apenas o horror, mas o que aprendi sobre a alma humana. Aquela imagem tornou-se uma corda lançada no meio do abismo, uma âncora para minha alma.

Acreditei que, mesmo na dor, havia um propósito. Esse ‘porquê’ - encontrar sentido na existência - foi o que me manteve vivo. Não era apenas sobreviver; era descobrir um motivo maior para continuar.

Quando fui libertado, em 1945, após a queda do regime nazista, enfrentei um vazio ainda mais cruel. Minha família - pais, irmão, esposa - havia desaparecido, engolida pelo Holocausto.

Poderia ter sucumbido ao desespero, mas escolhi transformar a dor em criação. Assim nasceu O Homem em Busca de Sentido, um livro escrito não para buscar fama, mas para testemunhar que, mesmo quando te tiram tudo, se encontrares um ‘porquê’, sempre haverá um ‘como’.

Escrevi para mostrar ao mundo que o sofrimento, quando inevitável, pode ser suportado se houver um propósito. A vida não nos poupa de tragédias. Mas sempre teremos o poder de escolher como responder a elas.

E essa escolha - a liberdade última do espírito humano - pode nos salvar.”

Viktor E. Frankl

Contexto e Acontecimentos

Viktor Emil Frankl (1905–1997), neurologista e psiquiatra austríaco, foi prisioneiro do regime nazista durante a Segunda Guerra Mundial. Como judeu, ele foi deportado em 1942 para o gueto de Theresienstadt, junto com sua esposa Tilly e seus pais.

Posteriormente, foi transferido para Auschwitz, o mais infame dos campos de extermínio, e depois para campos menores, como Kaufering e Türkheim, onde enfrentou trabalho forçado, fome e a constante ameaça de morte.

O Holocausto, que resultou no genocídio de seis milhões de judeus e milhões de outras vítimas, foi marcado por atrocidades sistemáticas, incluindo experimentos médicos, execuções em massa e condições desumanas nos campos.

Os acontecimentos descritos no texto refletem a experiência de Frankl em meio a esse horror. Ele testemunhou a destruição física e psicológica de milhares de prisioneiros, mas também observou que aqueles que encontravam um propósito - como a esperança de reencontrar um ente querido ou de realizar um sonho - tinham maior chance de resistir.

Essa observação tornou-se a base da logoterapia, sua teoria psicológica que postula que o desejo humano de encontrar sentido é a principal força motivadora da vida. Após sua libertação em 1945, pelas forças aliadas, Frankl descobriu que sua esposa, pais e irmão haviam sido mortos.

Apesar da devastação, ele canalizou sua dor em sua obra-prima, O Homem em Busca de Sentido (publicado originalmente em 1946, com o título Ein Psychologe erlebt das Konzentrationslager), que combina memórias do Holocausto com reflexões sobre a resiliência humana.

O livro tornou-se um clássico, traduzido para dezenas de idiomas e amplamente usado em psicologia, filosofia e educação.

Ampliação Temática

O relato de Frankl transcende sua experiência pessoal e oferece uma lição universal sobre resiliência. Sua ideia de que o sentido pode ser encontrado até nas piores circunstâncias ressoa em contextos modernos, como crises pessoais, luto ou desafios coletivos (pandemias, guerras, desigualdades).

O conceito de logoterapia influenciou a psicologia humanista e continua relevante em terapias que buscam ajudar indivíduos a enfrentar traumas. Além disso, o texto de Frankl é um testemunho do Holocausto, um lembrete da necessidade de preservar a memória das vítimas e combater o negacionismo.

Nos campos, ele viu tanto o pior da humanidade - a crueldade dos guardas nazistas - quanto lampejos de bondade, como prisioneiros que dividiam seu último pedaço de pão.

Esses contrastes reforçam sua crença de que, mesmo em meio ao caos, a escolha de manter a dignidade é um ato de resistência. Hoje, o legado de Frankl vive em instituições como o Viktor Frankl Institute, em Viena, e em iniciativas que promovem sua filosofia.

Sua mensagem é particularmente poderosa em um mundo marcado por incertezas, onde as pessoas buscam sentido em meio a crises globais, como mudanças climáticas ou polarização social.

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