O Contribuinte
"Me arrancam tudo à força e depois me chamam de contribuinte." - Millôr Fernandes
Essa
frase icônica de Millôr Fernandes, com seu tom crítico e mordaz, reflete uma
insatisfação profunda com a relação entre o cidadão e o Estado, especialmente
no que diz respeito à carga tributária e à falta de reciprocidade na gestão dos
recursos públicos.
Escrita
com a ironia característica do autor, a citação expõe a contradição entre o
termo "contribuinte" - que sugere voluntariedade e participação
cívica - e a realidade de impostos cobrados de forma compulsória, muitas vezes
sem que o cidadão perceba benefícios diretos ou justos em retorno.
No
contexto brasileiro, onde Millôr viveu e produziu, a frase ganha ainda mais
peso. O Brasil possui uma das maiores cargas tributárias da América Latina, com
impostos que incidem sobre quase todos os aspectos da vida cotidiana: consumo,
renda, patrimônio, serviços.
Em
2025, segundo dados recentes, a carga tributária brasileira continua próxima de
33% do PIB, uma cifra alta para um país onde a infraestrutura pública, a saúde
e a educação ainda enfrentam desafios crônicos.
A
sensação de "ser arrancado à força" descrita por Millôr ressoa com a
experiência de muitos brasileiros que, ao pagar impostos, sentem que o dinheiro
não retorna em forma de serviços públicos de qualidade.
Além
disso, a frase de Millôr também pode ser lida como uma crítica à falta de
transparência e responsabilidade na gestão dos recursos públicos.
Escândalos
de corrupção, como os que marcaram a história recente do Brasil - desde o
Mensalão até os desvios investigados pela Operação Lava Jato -, reforçam a
percepção de que os impostos, longe de serem uma "contribuição" para
o bem comum, muitas vezes alimentam interesses privados ou são mal geridos.
Em
2025, embora haja avanços em mecanismos de combate à corrupção, como a
ampliação do uso de tecnologias para monitoramento de gastos públicos, a
desconfiança do cidadão permanece.
Relatos
recentes nas redes sociais, mostram que muitos brasileiros ainda se sentem
desamparados diante de promessas não cumpridas de melhoria nos serviços
essenciais.
Por
outro lado, a ideia de "contribuinte" como alguém que doa de
"livre e espontânea vontade" evoca um ideal utópico de cidadania,
onde o pagamento de impostos seria um ato de confiança mútua entre o indivíduo
e o Estado.
Para
que isso ocorresse, seria necessário não apenas uma gestão pública eficiente,
mas também uma relação de respeito e diálogo com a sociedade.
Iniciativas
como audiências públicas para discutir orçamentos e a ampliação do acesso a
portais de transparência são passos nesse sentido, mas ainda insuficientes para
mudar a percepção geral.
A
crítica de Millôr, portanto, segue atual. Ela nos convida a refletir: até que
ponto somos realmente "contribuintes" no sentido pleno da palavra? Ou
será que continuamos apenas a cumprir uma obrigação imposta, sem voz ativa
sobre o destino do que nos é "arrancado"?
Talvez a verdadeira contribuição comece quando o cidadão se engaja, cobra e participa ativamente da construção de uma sociedade mais justa - algo que Millôr, com seu humor afiado, certamente endossaria.
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