Não é de uma vez que se morre...
O tempo é indivisível. Quem pode fragmentá-lo em dias, meses ou anos? Para que serve o calendário, senão para impor uma ordem ilusória ao fluxo contínuo da existência?
As
folhas tombam, uma a uma, mas a árvore permanece, firme contra o vento incerto
e vário. Assim é o tempo: um sopro eterno que não se deixa prender pelas grades
dos relógios.
A vida,
também, é indivisível. Mesmo aquela que parece mais errante, mais dispersa,
está entrelaçada num diálogo universal. A conversa mais banal, o riso fugaz, o
silêncio que pesa - tudo pertence a um mesmo tecido, a uma sinfonia que não
cessa.
Não há
instante que se perca, pois cada um carrega o eco de todos os outros. Todos os
poemas são fragmentos de um único poema, escrito na linguagem secreta do
cosmos.
Todos
os porres, com suas confissões desajeitadas, são o mesmo porre, onde a alma se
despe e dança na penumbra. Não se morre de uma só vez, mas em pequenos sorvos,
em despedidas sutis, em instantes que nos escapam sem que percebamos.
E, no
entanto, também não se vive de uma só vez: a vida se renova em cada olhar, em
cada toque, em cada amanhecer que insiste em nascer.
Todas
as horas são extremas. Não há momento que seja trivial, pois cada um carrega o
peso do eterno. Nos acontecimentos do mundo - as guerras que rugem, os abraços
que curam, as vozes que se erguem, os silêncios que oprimem - há sempre um fio
que nos conecta ao todo.
O grito
de revolta em uma praça distante, a lágrima de uma mãe, o voo de um pássaro que
ninguém vê: tudo isso pulsa no mesmo coração da existência. Cada evento, por
menor que seja, é um verso no grande poema do tempo.
E assim
seguimos, entre o efêmero e o eterno, tecendo nossa história com fios de luz e
sombra. O tempo não para, mas também não passa: ele é. A vida não se divide,
mas se multiplica em infinitos instantes que, no fundo, são um só.
E nós,
viajantes desse mistério, continuamos a escrever, a amar, a errar, a sonhar -
porque, no fim, todas as horas são extremas, e todas as vidas são uma só.
Baseado no texto de Mario Quintana
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