Um Dia, Talvez
Um dia serei apenas passado, um eco preso no lugar
secreto onde o tempo se recolhe. Uma figura em algum retrato antigo, esquecido
num canto qualquer, coberto de pó.
Talvez, ainda assim, serei lembrado - não com
intensidade, mas com a doçura de um sorriso leve, de um suspiro solto no ar. Recordarás,
talvez, um instante singelo, naquela tarde de outono em que o céu se tingia de
amarelo e nossos risos se entrelaçavam sem medo do amanhã.
Havia nos teus olhos uma promessa, e nos meus, a
certeza de que o amor nos pertencia. Mas nesse dia futuro, quando fores
assaltada pela lembrança, já estarei ausente, distante dos sonhos urgentes que
sonhamos com tanto ardor.
Estarei diluído no tempo, substituído em silêncio,
esquecido como um estranho no coração que um dia fui chamado de lar. Ainda
assim, de ti não me despeço por completo.
Carrego cada detalhe teu: teu riso guardado em mim
como ondas eternas no mar, tuas palavras gravadas nas dobras da memória como
tatuagens indeléveis, teu olhar, que atravessava o instante e o tornava
infinito.
E teu sorriso - ah, teu sorriso - esse irei buscar em
cada rosto, em cada encontro fortuito, como quem procura um reflexo perdido. Mas
sei, no fundo, que ninguém preencherá o vazio que deixaste, um espaço que o
tempo não apaga e que só tua presença soube iluminar.
Foste tu, e apenas tu, quem fez meu coração pulsar com
intensidade rara.
Foste quem me moldou, quem me transformou no que sou. E quando a noite se
estende, silenciosa e povoada de estrelas errantes, fecho os olhos e te
encontro de novo.
Vejo-te como sol dos meus dias, como brisa do entardecer, e percebo que até no silêncio mais profundo é contigo que ainda quero viver. Quem sabe, um dia, quando o destino se cansar de nos manter distantes, ele nos trará de volta ao mesmo caminho. E talvez, nesse reencontro inesperado, possamos enfim recomeçar.
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