Umberto Eco e “O Nome da Rosa”


 

Quando o abade cego pergunta ao investigador William de Baskerville: ′′Que almejam verdadeiramente?”

Baskerville responde: ′′ Eu quero o livro grego, aquele que, segundo vocês, nunca foi escrito. Um livro que só trata de comédia, que odeiam tanto quanto risos.

Provavelmente é o único exemplar conservado de um livro de poesia de Aristóteles. Existem muitos livros que tratam de comédia. Por que esse livro é precisamente tão perigoso?”

O abade responde: ′′ Porque é de Aristóteles e vai fazer rir “.

Baskerville replica: ′′ O que há de perturbador no fato de os homens poderem rir?”

O abade: ′′O riso mata o medo, e sem medo não pode haver fé. Aquele que não teme o demônio não precisa mais de Deus”.

E assim seguem as religiões pelos tempos remotos, ficando cada vez mais ricas explorando o medo das pessoas por meio de supostos castigos que possam atingi-los ou até mesmo os levarem ao inferno.

Um incrível trecho de “O Nome da Rosa”, de Umberto Eco!

Esse diálogo entre William de Baskerville e o abade cego em O Nome da Rosa encapsula um dos principais temas do romance: o conflito entre conhecimento e poder, razão e fé, liberdade e controle.

A obra de Umberto Eco, ambientada em uma abadia medieval, utiliza a investigação de uma série de mortes misteriosas para explorar questões filosóficas e teológicas, colocando o riso como uma metáfora poderosa para a liberdade de pensamento.

O trecho reflete o medo institucionalizado que a Igreja tinha do riso, visto como algo subversivo. Para o abade, o riso desestabiliza a ordem ao minar o medo, elemento fundamental para manter a obediência e a fé.

No entanto, William contrapõe isso com uma visão iluminista: a ideia de que a liberdade, mesmo em formas simples como o riso, é essencial para o florescimento humano.

Essa tensão ecoa pelas eras, especialmente no modo como as religiões e instituições controlam narrativas para perpetuar seu poder. O medo - do inferno, do pecado, do desconhecido - é frequentemente usado como uma ferramenta de domínio, enquanto o riso, uma expressão de liberdade, é retratado como perigoso por desarmar essa ferramenta.

No entanto, como Eco sugere, essa libertação também é uma forma de se aproximar do que há de mais humano e genuíno: a busca pelo conhecimento e pela alegria.

Ao refletirmos sobre esse trecho, podemos ver sua relevância no mundo moderno, onde o controle das ideias ainda é uma questão fundamental. O riso, como forma de resistência, continua a desarmar medos impostos e desafiar autoridades, fazendo de O Nome da Rosa uma obra não apenas histórica, mas atemporal.

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