Charles Bukowski – Passos que não chegam
“Já não quero mais tudo. Só algum conforto, um pouco de sexo, e um amor menor. Agora, apenas espero outra vez, enquanto os anos se vão. Tenho meu rádio, e as paredes da cozinha são amarelas.
Vou esvaziando garrafas, ouvindo, atento, os passos que não chegam. Espero,
ao menos, que a morte seja mais leve do que isto.”
Charles Bukowski
O trecho
de Charles Bukowski reflete um momento de resignação e introspecção
profundamente melancólica, típico de sua escrita. Ele aborda temas como a
passagem do tempo, a solidão e o desejo por alívios simples diante da
complexidade da vida.
A frase
inicial, “Já não quero mais tudo. Só algum conforto, um pouco de sexo, e um
amor menor”, indica um amadurecimento amargo. Não se trata de um
conformismo tranquilo, mas de um ajuste às circunstâncias, em que as grandes
ambições da vida dão lugar a necessidades mais básicas e acessíveis, quase como
migalhas de felicidade. Bukowski, com seu estilo cru, descarta a idealização do
amor e da vida, preferindo focar na sobrevivência emocional.
Na
sequência, “Agora, apenas espero outra vez, enquanto os anos se vão”, o
autor expressa a sensação de estar preso a um ciclo de passividade, onde a vida
é vista como um escoar inevitável do tempo.
A rotina
de esvaziar garrafas, ouvir rádio e observar as paredes amarelas da cozinha
cria uma imagem de claustrofobia existencial, um espaço onde os detalhes cotidianos
passam a ser os únicos companheiros.
A espera
pelos “passos que não chegam” simboliza a ausência de conexão e
esperança. Esses passos podem representar tanto uma presença física quanto a
expectativa de mudança, mas, acima de tudo, revelam um vazio irreparável. É uma
solidão que Bukowski não apenas descreve, mas escancara de forma pungente.
Por fim,
a última linha, “Espero, ao menos, que a morte seja mais leve do que isto”,
encapsula o desespero e a falta de sentido que atravessam o texto. A morte, embora
carregue uma conotação sombria, aparece aqui como um possível alívio, algo mais
suportável do que o peso esmagador da existência diária.
A obra de
Bukowski frequentemente retrata a vida sem filtros ou floreios, trazendo à tona
uma sensibilidade brutal. Esse texto é uma janela para um espírito que se
reconhece vencido pela monotonia, pela solidão e pela consciência inevitável da
finitude.
É, ao mesmo tempo, um grito de desespero e uma aceitação quase resignada de que a vida é isso: uma coleção de dias preenchidos por pequenas esperas, com o desejo constante de que o fim seja mais suportável do que o percurso.
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