Venceslao Moguel - El Fusilado


 

Venceslao Moguel tinha apenas 25 anos quando, em 18 de março de 1915, sua vida foi arrancada do curso comum e lançada no caos da Revolução Mexicana. Capturado sob a acusação de apoiar os revolucionários, ele não teve direito a julgamento, nem a uma chance de se defender.

A Revolução, que desde 1910 agitava o México com conflitos entre facções, ideais e traições, não poupava os suspeitos. Para os soldados do governo, Moguel era apenas mais um nome na lista de inimigos a eliminar. O veredicto foi seco e brutal: morte por fuzilamento.

Naquele dia, em uma praça empoeirada de Yucatán, Moguel enfrentou o pelotão de execução. Seus olhos, talvez carregados de medo, raiva ou resignação, encararam os fuzis apontados para seu peito.

Não havia espaço para súplicas. Oito disparos ecoaram, rasgando seu corpo. Ele tombou, inerte, entre os cadáveres de outros condenados, o chão manchado de vermelho.

Mas o ritual de execução ainda não havia terminado. Como era costume, um soldado se aproximou para o tiro de misericórdia. O cano frio da arma encostou em sua nuca. Um último disparo ressoou.

O mundo escureceu. Mas, contra todas as expectativas, não acabou.

Horas depois, no silêncio da noite, algo impossível aconteceu. Coberto de sangue, com o corpo perfurado por nove balas, Moguel despertou. A dor era insuportável, mas a vontade de viver era maior.

Arrastando-se com uma determinação quase sobre-humana, ele percorreu três quarteirões, deixando um rastro de sangue e coragem. Seu destino era a Igreja de Santiago Apóstolo, um refúgio sagrado em meio ao horror da guerra.

Lá, um paroquiano o encontrou, semimorto, mas ainda respirando. Comovido e correndo o risco de ser descoberto pelas autoridades, o homem escondeu Moguel em sua casa, tratando suas feridas às escondidas, com recursos improvisados e uma dose de ousadia.

Nenhum dos nove tiros havia atingido seus órgãos vitais. Os médicos que mais tarde o examinaram não conseguiam explicar como ele sobrevivera. As balas, por algum capricho do destino, evitaram coração, pulmões e artérias principais.

Mas a sobrevivência de Moguel não foi apenas um milagre biológico. Foi um ato de resistência feroz, uma recusa obstinada em ceder à morte imposta por seus algozes.

A Revolução Mexicana, que moldou essa história, era um caldeirão de violência e ideais. De um lado, os revolucionários, como os zapatistas e villistas, lutavam por justiça social, terra e liberdade.

De outro, o governo de Victoriano Huerta e, mais tarde, as forças de Venustiano Carranza, buscavam manter o controle, muitas vezes com punho de ferro.

Fuzilamentos como o de Moguel eram comuns, um símbolo da brutalidade com que se tentava esmagar dissidências. Mas, em meio a esse cenário de desespero, histórias como a de Moguel brilhavam como raros testemunhos de esperança e resiliência.

Venceslao Moguel sobreviveu não apenas à execução, mas também à própria Revolução. Ele carregou as cicatrizes dos nove tiros pelo resto da vida, um mapa de sua resistência gravado na pele.

Sua história se espalhou, primeiro como um sussurro entre os moradores de Yucatán, depois como uma lenda que atravessou fronteiras. Ele ficou conhecido como El Fusilado - “O Fuzilado” -, um apelido que não celebrava sua queda, mas sua coragem indizível de se levantar.

Anos depois, Moguel contou sua história em programas de rádio e até em um famoso show americano, o Ripley's Believe It or Not! onde sua sobrevivência foi apresentada como um dos maiores feitos da tenacidade humana.

Ele viveu até os anos 1970, uma testemunha viva de que, mesmo diante da morte certa, o espírito humano pode desafiar o impossível.

Venceslao Moguel não foi apenas um sobrevivente. Ele foi um símbolo. Um homem que, contra todas as probabilidades, olhou para a escuridão e escolheu viver.

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